O paciente chega no seu consultório para um primeiro atendimento, olha bem no fundo dos seus olhos e diz: “Doutor (a), eu já utilizei aparelho antes, coloquei aquele ferrinho atrás dos dentes, mas ele caiu depois de um tempo e eu nunca voltei no dentista para colocar, agora meus dentes movimentaram e estão um em cima do outro, o que eu faço?” E esse texto se repete, com pequenas alterações, mas a história é sempre a mesma. Abordamos em um artigo anterior, que você pode acessar AQUI o motivo pelo qual acontecem essas recidivas.
Conhecido como recidiva ortodôntica, apinhamento terciário ou apinhamento tardio, vários nomes para um mesmo inconveniente definido como uma sobreposição dentária causada por uma redução na distância entre os caninos e pré-molares, ou seja, uma diminuição no formato geral do arco.1 Essa má oclusão pode ser corrigida através de diferentes mecânicas, dependendo da complexibilidade do apinhamento, que são: vestibularização, desgastes interproximais e extração dentária, que serão cenas de próximos episódios.2
Começando de forma gentil e moderada, um apinhamento pequeno, suave, com pequenos giros, uma distância intercaninos suavemente diminuída, nos dando algumas alternativas de tratamento. Supondo que os incisivos superiores aceitem suave protrusão, que somada ao aumento da distância intercaninos, vou conseguir o espaço suficiente para dissolver esse apinhamento, tenho a primeira opção de tratamento. Mas em um paciente que já apresenta uma protrusão acentuada no arco superior, uma adequada distância intercaninos, precisamos tirar uma carta escondida de baixo da manga, o desgaste interproximal, reduzindo o tamanho dos dentes e garantindo espaço suficiente para correção desse apinhamento. De forma resumida, preciso ganhar espaço de alguma forma, seja aumentando o tamanho do arco, vestibularizando os incisivos ou fazendo desgastes interproximais. Para tomar essa decisão é necessário o diagnóstico e plano de tratamento adequado.
Em seguida vamos para um apinhamento moderado, no qual suaves movimentos não serão suficientes para corrigir o apinhamento, precisamos unir cartas para conseguir atingir meu objetivo. Nestes casos, normalmente observamos a quantidade de vestibularização que podemos fazer, exploramos ao máximo esse espaço, deixamos um trespasse justo, tomando cuidado para não causar um toque prematuro, em seguida, vamos para o desgaste interproximal (IPR). Vasculhando a literatura sobre o assunto, uma revisão sistemática aponta que em dentes anteriores temos cerca de 0.5mm de esmalte dentário nas faces mesiais e distais, enquanto os dentes posteriores chegam a ter até 1mm. Os desgastes com alinhadores, pensando que são feitos metade em um dente e metade no dente ao lado, não pode ultrapassar 0.5mm considerando que seria removido 0.25mm de cada dente que está naquele contato e que ao final, os dois dentes ainda teriam 0.25mm de esmalte dentário (IMAGEM).
E chegamos no desafio maior, para corajosos, casos de apinhamentos severos. Partimos do pressuposto nesses casos que o número de alinhadores vai ser muito grande, pensando que tiramos dentes que podem variar de 5 a 8 mm de tamanho e que todo esse espaço deve ser preenchido com a migração de outros dentes para o local no qual ele estava situado, temos então um problema. Para estes casos sugerimos o uso de mecânicas auxiliares, ancoragem esquelética e/ou uso de elásticos, todos os artifícios são bem-vindos nestes casos. Dizemos que apinhamentos severos são difíceis de serem corrigidos com alinhadores, não que sejam fáceis com o aparelho convencional fixo, porém, em ambas as situações é necessário ter um controle rígido da mecânica escolhida e de ancoragem. Os casos de extrações são casos de apinhamentos severos em que eu não tenho espaço suficiente para dissolver com vestibularização, expansão do arco e desgastes, somando todas as opções de abertura de espaço não seriam suficientes para dissolver o apinhamento.
De forma didática, separei os níveis de apinhamento e como deve ser feito o seu plano de tratamento, sempre visando atingir o melhor resultado possível para seus clientes. Um exame clínico completo é sempre bem-vindo, somado com análise do sorriso, corredor bucal, projeção do lábio superior e inferior, trespasse interincisivos, duração do tratamento, nível de complexibilidade e a queixa do paciente.
1. Freitas KMS, Massaro C, Miranda F, de Freitas MR, Janson G, Garib D. Occlusal changes in orthodontically treated subjects 40 years after treatment and comparison with untreated control subjects. American Journal of Orthodontics Dentofacial Orthopedics. 2021;160(5):671-685.
2. Siqueira DF, Rodrigues de Oliveira G, Bramante FS, Renato Paranhos L, Antonio Scanavini M. Apinhamento terciário: causas e opçÕes terapêuticas. Revista Clínica de Ortodontia Dental Press. 2011;10(1).